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Reportagem do estudante Artur Ferreira, da graduação em Jornalismo
A crise no mercado editorial se intensifica com o isolamento social? O estudante do 5º semestre de Jornalismo, Artur Ferreira, resolveu levantar esta pauta e escrever uma reportagem, que publicamos a seguir.
A apuração das informações e a edição do texto foi acompanhada pelo prof. Aldo Quiroga.
Crise no mercado literário se intensifica devido ao isolamento social
Em reação à crise, livreiros e empreendedores do setor investem em novas formas de se chegar ao cliente
Por Artur Ferreira
Desde o início do mês de março, segundo recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), o surto de coronavírus foi categorizado como uma pandemia, o que causou o fechamento em massa de locais de grande aglomeração.
Todo o varejo foi afetado em alguma escala. E para o setor da cultura não foi diferente, casas de shows, teatros e praças públicas ao redor do mundo foram fechadas. E dentre os mercados culturais um dos mais afetados, pela Covid-19, foi o setor editorial.
Os grandes nomes do varejo do livro já vinham passando por uma crise de anos. Livrarias como a Saraiva e a Cultura estavam em processo de reestruturação e recuperação judicial muito antes do vírus chegar ao Brasil.
Em nota, o Presidente do SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros), Marcos da Veiga Pereira, afirmou que somente na 12ª semana do ano houve uma queda de 40% nas vendas de livros.
Além da queda nas vendas, somente na terceira semana de Abril, a Saraiva demitiu 500 funcionários de uma única vez. Desses trabalhadores afetados, 300 atuavam em centros de distribuição e mais 200 estavam nas lojas da rede.
Além disso, a empresa irá parcelar todos os benefícios e direitos trabalhistas pagos aos funcionários demitidos em até 20 meses.
Segundo o editor do Grupo Editorial Nacional e professor de direito da PUC Campinas, Henderson Furst, se uma empresa está em recuperação judicial ela pode estar considerada “em crise”, e a instabilidade desses grandes nomes do mercado é representativa de que o próprio setor em geral está em retração.
De acordo com Furst, o cenário editorial brasileiro já passava por uma crise crescente, muito antes do surgimento da pandemia, desde 2015, mais especificamente. “2018 foi o pior ano na história do mercado” de livros nacionais, afirma o editor.
O professor explica que os livros técnicos e acadêmicos, os CTP (livros Científicos, Técnicos e Profissionais) foram uma das categorias mais afetadas. Furst pondera que hoje em dia, nas universidades mesmo com o aumento de estudantes de direito, e advogados, os livros jurídicos estão em queda constante.
Segundo ele, uma das razões para isso é que as novas gerações estão optando por outras formas de estudo e busca de conhecimento, sendo assim, compras de livros estão se tornando cada vez mais raras.
Para compreender esse cenário em números, Furst cita a pesquisa Retratos da Leitura do Brasil de 2016, que afirma que o brasileiro lê somente 2,43 livros por ano.
Além dos novos hábitos da população brasileira, as altas taxas de analfabetismo são outro agravante para o mercado literário. Ao todo, mais de 11 milhões de pessoas não conseguem nem ler e escrever, sendo assim, o livro se torna um item inalcançável para essa parcela da população.
A teoria de que o consumo do brasileiro mudou e está afetando o setor é reiterada pelo editor Sérgio Reis Alves da Cosmos Editora.
Ele pontua que a crise causada pelo coronavírus foi uma multiplicação da instabilidade do setor. Para o editor, o principal meio para a sobrevivência de livrarias e editoras é optar pela venda online.
Mas Alves deixa claro que “nem tudo é culpa do coronavírus, basta ver o repasse para cultura, é irrisório.”
Alves fala que a falta de ajuda por parte do poder público nestes últimos anos foi um fator importante para essa crise. “Nos últimos governos isso [o apoio ao mercado do livro] piorou drasticamente”, conta o profissional.
Alves também é membro do Conselho do Plano Municipal de Livros, Literatura e Biblioteca do Munícipio de São Paulo, e entre as medidas requisitadas pelo Conselho para as autoridades é que sejam revistas linhas de crédito para as empresas do ramo e isenção de impostos para editoras e livrarias.
E qual a reação dos livreiros ao isolamento social?
Para além do enfraquecimento dos grandes nomes do setor, pequenas e médias livrarias têm surgido no Brasil como uma alternativa para a venda de livros físicos, além do varejo online. São redes como a Livraria da Tarde, Nobel e Travessa.
Entre os livreiros de pequeno porte, e que não possuíam um e-commerce ainda em formação, a solução foi utilizar das redes sociais. As publicações online são o principal meio para se aproximar novamente dos seus clientes, que não poderiam mais frequentar fisicamente os endereços das livrarias.
As fundadoras da Livraria Mandarina, localizada no bairro de Pinheiros em São Paulo, Daniela Amendola e Roberta Paixão contam que sempre tiveram um grande interesse pessoal pela literatura. Ambas tinham como meta montar a própria livraria, mesmo em um cenário desfavorável ao consumo dos livros.
Roberta explica que durante o processo de criação da Mandarina, conversou com editores, outros livreiros e percebeu que a tão falada “crise”, era principalmente algo que tangia as grandes redes do ramo.
A livreira explica que o rumo que a Mandarina teria que tomar era o de criar laços com o cliente da loja. “Mesmo quando não temos o livro que o leitor quer, entramos em contato com a editora e o requisitamos, é como se fosse uma curadoria em conjunto com o cliente”, explica Roberta.
Além dessa prática de se criar essa “amizade” com o leitor, as sócias investiram duramente em redes sociais, como Facebook e Instagram. Realizam constantes divulgações dos novos produtos disponíveis e coletam relatos de autores que são vendidos na Mandarina e os publicam em seus perfis.
E desenvolveram, mesmo que de forma prematura, seu e-commerce. Roberta conta que o site da livraria estará completo somente em maio, e enquanto isso, telefone e redes sociais são o principal meio de sobrevivência da livraria.
Novas formas de se consumir o livro
Dentre as medidas recomendadas, pela maioria dos especialistas da saúde neste período de pandemia, é que além da higienização das mãos, as pessoas evitem ao máximo sair de suas casas.
Porém, caso o leitor esteja afoito para se distrair neste período de quarentena, e não queira esperar todo o tempo necessário para se adquirir um livro novo pelo varejo online, existem outras maneiras de se entrar em contato com a literatura.
Mas para além do lugar comum do livro digital, o e-book, novas iniciativas propõem ouvir livros e até mesmo reinventaram a forma de se receber livros em casa.
Cláudio Gandelman, CEO da Autibooks, conta que em um momento como este de pandemia, uma forma totalmente segura de se consumir um livro novo é simplesmente ouvi-lo.
Pensando nessa demanda, Cláudio e toda a equipe da empresa, criaram a campanha “Vamos ajudar” para incentivar a leitura, através dos ouvidos.
Toda semana, estão disponibilizando um audiolivro gratuito, para que os novatos no aplicativo da Autibooks entendam como funciona ouvir uma obra.
Além disso, o dinheiro arrecadado na compra da assinatura do serviço da Autibooks durante a campanha será destinado para a compra de cestas básicas para moradores da Cidade Deus (RJ), para auxílio de famílias, de baixa renda, na quarentena.
E mesmo que ainda seja um valor custoso de produção, devido a necessidade de um estúdio para a gravação das narrações e a edição deste áudio, Gandelman acredita no crescimento deste mercado de audiolivros.
Segundo o CEO, é investido cerca de 10 mil reais e é necessário um período de em média de três meses para se produzir um único audiolivro.
Gandelman cita que os serviços de streaming de música e o “consumo do podcast facilita o público” para se adaptar ao formato que já é consolidado em diversos mercados editoriais mundo afora.
Para os leitores fiéis ao livro físico, e que queiram receber novas recomendações de leitura, como as que receberiam caso estivesse em uma conversa com um atendente de uma livraria, uma opção pode ser o serviço de assinatura da TAG Livros.
A empresa gaúcha, fundada em 2013, foi criada por três amigos que acreditaram que os serviços de assinatura seriam uma forma promissora de se lançar um novo produto. E ao observar o mercado literário, perceberam um espaço vago a ser ocupado.
Os empreendedores então lançaram a TAG, o serviço oferece atualmente dois modelos de assinatura.
A assinatura “Curadoria” consiste em publicar livros bem avaliados pela crítica literária e que sejam inéditos no Brasil ou estejam esgotados. Já o modelo “Inéditos” oferece ao assinante todo mês um novo best-seller que tenha feito sucesso no exterior e que não tenha sido publicado no mercado editorial nacional.
De acordo com Arthur Dambros, cofundador e Diretor de Marketing da TAG, um dos objetivos é recomendar a literatura de uma forma que todo mês o assinante tenha o sentimento de surpresa e ansiedade pelo livro novo. E todos os livros são recomendados por autores, críticos e artistas em geral.
Porém, Arthur afirma que mesmo que a TAG não seja considerada uma editora propriamente, a atual crise no setor afeta a empresa. O diretor explica que muitos dos seus produtos são feitos e pensados em parceria com editoras.
Além disso, com a pandemia, gráficas e outros serviços necessários para se produzir um livro, também sofreram retração, e acabaram por frustrar certos planos da TAG para o futuro. “E ainda não sabemos se essa crise vai gerar um número de cancelamentos das assinaturas, ainda não temos como saber”, explica Arthur.
Ainda assim, o diretor diz com esperança que o serviço vai continuar a funcionar, e que toda a equipe da empresa está trabalhando em formato de home office.
E a reação dos editores e gestores das grandes empresas do ramo?
O SNEL criou uma área específica em seu site para tratar do Covid-19. Desta forma, o Sindicato atualiza todas as novas medidas jurídicas tomadas pelo poder público.
O site também conta com análises sobre a atual situação da política brasileira e quais as consequências para o setor. Há também a resolução de dúvidas de livreiros e editores em relação à Medidas Provisórias ou qualquer outra tomada de decisão do governo em relação ao livro.
“Nossa previsão é que este número deve piorar no próximo Painel, pois as lojas físicas estão com faturamento praticamente zerado”, afirmou Marcos da Veiga Pereira, presidente do SNEL em nota.
O Painel do Varejo de Livros no Brasil também confirmou uma queda de 4,09% em volume de livros e 4,44% do valor do produto, em relação ao ano anterior. Ao todo, foi faturado R$ 128,63 milhões pelo setor livreiro neste período inicial de 2020.