Historiadores ex-alunos da PUC-SP criam acervo digital sobre a pandemia no Brasil
Fotos, relatos e documentos do projeto Memorial da Pandemia também estão em livro lançado neste mês
Todos os dias os impactos da pandemia no Brasil e no mundo são registrados em reportagens, fotos, vídeos, relatos, documentos que mostram como a Covid-19 mudou o dia a dia das cidades em quarentena, a rotina dos hospitais e a vida de milhares de pessoas de um continente ao outro.
Foi pensando em uma forma de preservar este capítulo essencial da história da humanidade que quatro historiadores ex-alunos da PUC-SP criaram o Memorial da Pandemia, um acervo digital dedicado às memórias deste período. O projeto nasceu de encontros virtuais que o grupo promovia para conversar e debater sobre temas atuais e a preocupação com o processo de documentação e memória da pandemia, principalmente no Brasil. “A ideia parte da multiplicidade de registros produzidos por telefones celulares, expostos nas mídias sociais, mas que são efêmeros na sua natureza. Dessa forma, debatemos para encontrar soluções e possíveis modos de preservação, coleta e manutenção da integridade destes materiais e informações. Decidimos então formar um acervo digital para reunir fontes primárias textuais e audiovisuais”, explica Pietra Diwan, bacharel, mestre e doutora em História pela PUC-SP. Ela e outros dois colegas do doutorado, Alexandre Teixeira, doutor em História e mestre em História Social, e Moisés Ferreira, doutor em História e mestre em Educação: História, Política e Sociedade, são os idealizadores do Memorial, que conta ainda com a participação de Cyntia Rossini, ex-aluna da especialização em História, Sociedade e Cultura.
Os materiais são coletados via formulário online disponibilizado no site do Memorial da Pandemia. Podem ser enviados arquivos de texto, fotos, prints de notícias, áudios, vídeos, e o colaborador precisa responder a um questionário e autorizar o uso daquilo que foi enviado. “Vão desde relatos pessoais, com desabafos sobre as agruras deste período, passando por poesias que flagram a subjetividade deste momento, e também fotografias de autoria própria, como de uma obra de arte elaborada nesta quarentena, espaços públicos esvaziados e imagens que simbolizam, ao menos para alguns cidadãos, o momento de reclusão e confinamento”, afirma Moisés Ferreira.
A curadoria é feita de forma coletiva pelos historiadores, levando em conta se o formulário de submissão foi devidamente preenchido por quem enviou e se a imagem não é ofensiva ou caluniosa para terceiros. Até o momento, o acervo possui trezentos registros e 25 entrevistas orais realizadas pelo grupo.
Além de disponibilizar parte da coleção no site do projeto, o grupo acaba de lançar o livro “Memorial da Pandemia: O acervo de todos nós”, que traz parte do conteúdo recebido até fevereiro deste ano. Para Cyntia Rossini, a publicação é um ato de resistência. “Não é fácil lutar contra o negacionismo, nem é fácil publicar um livro sem apoio de instituições e organizações. Tudo foi feito graças à colaboração dos nossos apoiadores, todos pessoas físicas, que gentilmente doaram valores em dinheiro, conhecimento, tempo, doaram sua escrita, sua fala, sua arte. Colaboraram conosco com ideias e com incentivo. Todo esse apoio foi fundamental para a realização deste trabalho”.
Dividido em duas partes, o livro contém quatro artigos dos membros fundadores com reflexões sobre o momento atual. As principais notícias nacionais e internacionais, a reinvenção do trabalho educacional, a mudança na sociabilidade, a economia criativa, o descrédito na ciência e o negacionismo foram os temas abordados pelos pesquisadores. A segunda parte da obra contempla parte do material recebido, além de uma coletânea com 16 entrevistas. “Infelizmente ainda não conseguimos acessar todas as diferentes classes socioeconômicas da sociedade na busca por esses fragmentos. Talvez isso possa ser corrigido em projetos futuros”.
Os interessados em acessar a íntegra do acervo precisam fazer uma solicitação específica de uso. “Em função dos limitados recursos financeiros e humanos, não temos uma base de dados pública disponível, mas esta é uma das metas do Memorial. Outra coisa importante é que o conteúdo seja respeitado na sua integridade e não pode ser usado com fins lucrativos ou comerciais. Ele é essencialmente para finalidade cultural, informativa e de pesquisa”, explica Pietra.
Quem quiser colaborar com o Memorial da Pandemia ou enviar alguma coleção de recorte específico deve entrar em contato com a equipe via email contato@memorialdapandemia.com. O projeto também recebe doações em uma campanha de arrecadação virtual disponível clicando aqui.
De olho no futuro pós-pandemia, Alexandre Teixeira acredita que o trabalho será uma herança importante para as próximas gerações. “Como praticamente tudo foi afetado pela pandemia, o que vai definir o tempo presente e futuro será a memória desse fato. Isso pode impedir a negação da história e da verdade dos acontecimentos, por isso o Memorial da Pandemia é um projeto aberto a recolher e guardar o máximo de informações nesse sentido”. Pietra acrescenta que a sociedade civil deve se engajar na defesa do direito à memória. “O Memorial da Pandemia pretende manter-se para não minimizar, mitigar, ou diminuir a importância das vidas perdidas, das famílias desfeitas, da necropolítica implementada, ou dos rituais de luto que não puderam ser realizados. Da mesma forma, é de extrema importância manter estes registros para que a pesquisa histórica possa compreender como foi feita a transição de práticas cotidianas de um modo a outro, à exemplo do trabalho, da educação, do lazer, do consumo, entre outros.”
Para saber mais sobre o Memorial da Pandemia, acesse o site, o Facebook, o Instagram ou o canal no YouTube.