Monkeypox: oportunidade de discutir estigmas

por Redação | 03/08/2022

Profa. Cibele Saad Rodrigues
Professora Titular do Departamento de Clínica e da pós-graduação da FCMS/PUC-SP, coordenadora acadêmica do Hospital Santa Lucinda, mestre e doutora pela UNIFESP.

Fernanda Saad Rodrigues
Infectologista, mestre e doutora pela UNESP - Faculdade de Medicina de Botucatu e coordenadora da CCIH do Hospital Regional de Sorocaba Dr. Adib Domingos Jatene

 

Apesar de a doença monkeypox receber a nomenclatura de varíola dos macacos, o atual surto não tem nada a ver com a participação de macacos na transmissão para seres humanos. Todas as transmissões identificadas até o presente momento, pelas diferentes agências mundiais de saúde, foram pela transmissão de pessoa a pessoa. Os macacos não são os “vilões”. Assim como nós, são “vítimas” e não podem sofrer retaliações e agressões, que levem a dano ou mesmo à morte. Maltratar os animais não resolve em nada o problema e abrimos um caminho para a injustiça com os primatas.

Outro ponto muito importante é o fato de que a transmissão é fruto de contato íntimo entre seres humanos, por meio das lesões de pele dos infectados, como ocorre quando nos beijamos, abraçamos ou mantemos relações sexuais. Também pode ocorrer por meio de secreções que ficam em objetos compartilhados e uso de utensílios comuns, roupas de cama e banho e superfícies onde o doente inadvertidamente deixou vírus.

Novamente outro estigma vem sendo propalado, que a população LGBTQIAP+ seriam os grandes responsáveis pela propagação da doença. Nós já assistimos esse filme quando a AIDS foi descoberta nos anos 70 e 80. Ser do grupo de risco não quer dizer que seja culpado. Por isso, temos que educar as pessoas para terem as informações corretas sobre a transmissão e a melhor forma de evitar que mais pessoas sejam expostas, sem apontar dedos para esse ou aquele grupo.

Na verdade, trabalhadores da área da saúde, assim como na COVID-19, membros da família de pacientes, pacientes com a imunidade baixa, crianças, gestantes, e até mesmo bebês ainda no ventre materno (forma transmitida pela placenta) são mais suscetíveis à contaminação, sem que isso signifique que a opção de gênero seja um fator de risco mais relevante que os demais.

A doença já foi considerada uma emergência global pela Organização Mundial de Saúde e foi constatada em 74 países. O período de incubação médio é de 6 a 13 dias.

Os sintomas mais comuns lembram uma gripe e se caracterizam por febre; calafrios; dores musculares, de cabeça, de garganta ou nas costas; fadiga, mal-estar e ínguas (linfadenopatia). Após três dias desta fase inicial, aparecem lesões na pele, na forma de máculas e pápulas, em qualquer parte do corpo. As lesões vão mudando de forma, no geral dentro de 12 dias, passando de máculas (manchas) para pápulas (elevadas na pele), vesículas (com conteúdo líquido), pústulas (com pus) e crostas (fase de cicatrização). Essas lesões são parecidas com varicela (catapora), herpes simples e zooster, sarampo, dengue, ou mesmo com sífilis, e um médico é a pessoa certa para fazer o diagnóstico diferencial e solicitar o exame confirmatório. Somente quando a fase crostosa desaparece é que o perigo de infecção cessa, o que ocorre em geral em 2 a 4 semanas, ou seja, durante esse período o indivíduo deve ficar afastado das atividades que exerce para evitar contágio. É importante saber que às vezes a forma é branda e pode ter uma lesão única, nem por isso deixa de ser monkeypox.

De forma geral, os pacientes têm boa evolução e poucos casos complicam, como foram vistos particularmente em alguns países da África, especialmente em grupos de risco já citados.

Não existe tratamento específico para esse vírus e o que se trata são os sintomas. Existe uma vacina desenvolvida para monkeypox (MVA-BN) que foi aprovada em 2019, mas ainda não está amplamente disponível e os próximos passos do governo federal deve ser ampliar sua produção e distribuição, especialmente para os mais susceptíveis e na linha de frente, como é o caso dos profissionais de saúde.

Enfrentar viroses tem sido uma constante ultimamente, no Brasil e no mundo, mas precisamos fazer essa tarefa com educação da população, por meio de boas informações, e prevenção da propagação com cuidados e vacinas. E, dar voz a estigmas e discriminação certamente não é solução.

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