Os joelhos dos atletas: tratamentos mais atuais e prevenção de lesões

por Redação | 10/08/2022

Professor-doutor Julio Cesar Gali
Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Professor livre docente da Disciplina de Ortopedia e Traumatologia da
Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da PUC-SP

 

O joelho é uma articulação que, devido à sua localização anatômica, é particularmente suscetível a traumas, especialmente nos esportes. As lesões nessa articulação ocorrem mais frequentemente em esportes como o futebol, basquete e judô, mas podem ocorrer em outras modalidades esportivas, como a ginástica, o vôlei, o tênis e o atletismo. Podem, ainda, acontecer em acidentes com veículos automotores.

O ligamento mais comumente lesado entre os atletas é o ligamento cruzado anterior (LCA). Seu dano pode impedir o retorno às atividades esportivas no mesmo nível anteriormente praticado. A incidência de novas lesões anuais do LCA é de 69 por 100 mil pessoas, sendo mais comum em homens (82 a cada 100 mil) do que em mulheres (55 a cada 100 mil). Nos Estados Unidos, ocorrem cerca de 250 a 300 mil lesões por ano, com custo estimado de US$ 2 bilhões.

Vários fatores podem contribuir para a ocorrência da lesão: o formato do fêmur ou da tíbia do paciente; presença de frouxidão articular; hiperextensão do joelho; fatores hormonais (existe maior possibilidade de lesões na primeira fase do ciclo menstrual feminino); interação do calçado com o chão, como em chuteiras com travas mais longas; e o nível de habilidade. Atualmente, é dada muita importância às assimetrias biomecânicas do tronco e membros inferiores e ao controle neuromuscular inadequado.

O diagnóstico da lesão do LCA é baseado na história clínica, no exame físico do joelho e nos testes ligamentares específicos. A ressonância magnética é útil para confirmar a ruptura do LCA e mostrar lesões associadas, como, por exemplo, dos meniscos e das cartilagens. O tratamento na urgência deve consistir em enfaixamento, gelo, muletas para evitar o apoio do membro acometido e elevação, para diminuir o inchaço.

A terapia não cirúrgica pode resultar em um nível de função satisfatório e é indicada para pessoas que aceitem modificação da atividade, realizem treinamento neuromuscular e que, eventualmente, usem um imobilizador. Cerca de um terço dos indivíduos com lesão do LCA conseguem se adaptar à nova situação, sem reconstruir o ligamento cirurgicamente. No entanto, a grande maioria não consegue praticar esportes, devido à possibilidade de entorses de repetição, causadas pela instabilidade ligamentar. Essas entorses podem gerar dores, inchaços e falseamentos, além de poder causar novas lesões dos meniscos e da cartilagem articular, facilitando a possibilidade de desgaste articular (artrose) a longo prazo.

O tratamento cirúrgico é indicado para jovens ou pessoas ativas com interesse na prática desportiva que envolva saltos ou movimentos de mudança de direção, nas frouxidões ligamentares graves e nas incapacidades funcionais determinadas pela instabilidade do joelho. As lesões de outras estruturas, como meniscos, demais ligamentos e cartilagem devem influenciar na decisão entre o tratamento operatório e não operatório.

Os melhores resultados da reconstrução cirúrgica do LCA são obtidos quando se é realizado um procedimento precoce, que possa restabelecer a anatomia mais próxima do normal; restaure a cinemática articular e promova a saúde articular a longo prazo. Na reabilitação pósoperatória, é permitido apoio imediato, com um par de muletas, por uma semana. A fisioterapia deve ser mantida até dois meses de pós-operatório. Feito isso, as pessoas são encaminhadas para um programa de condicionamento físico e treinamento neuromuscular. O retorno aos esportes deve ser feito um ano após a cirurgia, para que haja adaptação neuromuscular, pois há evidências científicas de que o retorno precoce não permite recuperar o equilíbrio tecidual e o controle neuromuscular.

Após uma lesão do LCA, a percepção e o controle neuromuscular do joelho são prejudicados. Essa deficiência pode persistir depois da reconstrução e reabilitação pós-operatória, o que pode ser um fator de risco de lesão do outro joelho.

O treinamento funcional combina controle neuromuscular, mobilidade e estabilidade articular, estabilidade central, alinhamento do tronco e articulações dos membros inferiores, diferentemente dos programas tradicionais de fortalecimento muscular. Com isso, várias articulações e músculos são exercitados nos três planos de movimento durante o treinamento, desafiando simultaneamente o cérebro e o corpo, o que diminui a possibilidade do risco de novas lesões quando comparado ao protocolo tradicional e é uma ferramenta a mais para promover um retorno seguro às atividades esportivas.

Estudos experimentais com constituintes biológicos – como o plasma rico em plaquetas, células tronco mesenquimais derivadas de tecido adiposo ou concentrado de aspirado de medula óssea – têm sido avaliados para acelerar a recuperação funcional após a reconstrução do LCA. Até o momento, os benefícios são clinicamente insignificantes e não resultam em melhor estabilidade do joelho ou menores taxas de falhas. Assim, novos estudos ainda são necessários para definir o papel exato desses agentes biológicos.

De qualquer modo, atualmente, os avanços diagnósticos de técnica cirúrgica e de reabilitação são capazes de tornar um joelho praticamente normal após a reconstrução do LCA, devolvendo ao paciente as condições de vida normais e, até mesmo, possibilitando o retorno à prática desportiva.

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