PUC-SP sedia encontro de reitores de universidades comunitárias promovido pela ABRUC
A reitora Maria Amalia Andery recebeu o prêmio Mérito Educação Comunitária pela sua...
Projetos surgiram a partir de reivindicações de estudantes e reflexões do Grupo de Trabalho de Inclusão Social da Universidade
Por: Thaís Polato
Um ciclo de palestras marca o lançamento da Biblioteca Negra da PUC-SP e da Coleção Autorias Negras, da Educ (Editora da PUC-SP). As atividades serão realizadas, ao vivo, de maneira online, dias 24, 25 e 26/5, a partir das 17h30. Clique para ver a programação. Para assistir, clique aqui ou acesse o facebook da PUC-SP.
Ambos os projetos surgiram a partir de reivindicações e reflexões realizadas no Grupo de Trabalho da Inclusão Social da PUC-SP, organizado pela Pró-Reitoria de Cultura e Relações Comunitárias. Desde 2018, o GT promove a interlocução entre diversos coletivos de estudantes, setores, gestores e professores para discutir e atuar em temas de inclusão social, racial, de gênero e de saúde mental. Uma das demandas abordadas no grupo foi, justamente, a falta de obras de autores e autoras negros e negras nas Bibliotecas da PUC-SP.
“A consolidação de um acervo de referência e o estímulo às autorias negras e à publicação de obras relevantes, que dialoguem com temas considerados urgentes e importantes pela comunidade puquiana, constituem movimentos convergentes dentro do mesmo assunto e que projetam também uma continuidade e um aprimoramento no tempo”, afirma o prof. Pedro Aguerre, o coordenador do GT de Inclusão Social, assistente Especializado da Pró-Reitoria de Cultura e Relações Comunitárias (ProCRC) e docente do curso de Administração (FEA).
Diretor da Educ e integrante do GT, Thiago Pacheco ressalta que a coleção Autorias Negras surge num contexto em que políticas públicas não apenas ampliaram o acesso da população negra à graduação, mas com o passar do tempo, também à pós-graduação, ou seja, ao nível mais estrito da produção de conhecimento. “Considerando esses cenários, e atinente à missão e à responsabilidade social da PUC-SP, a Educ entendeu ser necessário abrir um canal que promovesse a disseminação, em termos editoriais, do saber que vem sendo produzido por esses autores e autoras e/ou sobre a temática racial, e criou a série”, revela Pacheco. “O objetivo é abrir espaços e incentivar a publicação de tais obras e expandir a visibilidade sobre a temática, agregando elementos propícios ao debate e ao combate ao racismo estrutural na sociedade e estimulando práticas inclusivas no próprio ambiente de produção e difusão de conhecimento”, afirma o diretor da editora da PUC-SP.
Biblioteca Negra
A composição da coleção teve início em 2020, com um acréscimo de cerca 70 títulos às obras de autores negros já disponíveis na Biblioteca da PUC-SP. Este primeiro e significativo acréscimo foi obtido por meio de valores residuais do fundo de campanha da chapa que concorreu e saiu vencedora à Reitoria 2020-24, a “PUC-SP somos todos”.
O histórico mais detalhado do projeto se inicia em 2018, com uma série de reivindicações à Reitoria feitas pelo Coletivo Negrassô. Aguerre ressalta, portanto, que a marca desse acervo é seu caráter participativo, construído ao longo deste tempo num constante diálogo com a comunidade acadêmica. “O conjunto contempla obras de autoria negra fundamentais na contemporaneidade e tem um caráter dinâmico, pois irá acolhendo novas obras, de acordo com as demandas dos projetos pedagógicos dos cursos e disciplinas”, afirma.
O docente ressalta que, apesar do número de obras não chegar a uma centena ainda, pode-se dizer que o acervo “organiza uma base epistemológica concreta, trazendo perspectivas críticas aos saberes tradicionais, os quais muitas vezes reproduzem valores de uma sociedade de forte fundo escravista e patriarcal, que é bem representada pelo conceito de Racismo Estrutural”.
Pedro Maricato, coordenador de Bibliotecas da PUC-SP, revela que, embora os acervos de muitas bibliotecas universitárias contenham obras que discutam questões raciais, ele desconhece alguma outra experiência como a nossa. “A Biblioteca Negra que a PUC-SP inaugura se apresenta como uma ação antirracista organizada e persistente, porque pretende estabelecer uma política e uma rotina organizadas de curadoria e desenvolvimento desta coleção”, ressalta Maricato.
Todas as obras estarão fisicamente distribuídas junto aos demais livros do acervo, que são organizados por área de conhecimento e assunto. No entanto, para facilitar a pesquisa, a partir do catálogo online também será possível realizar buscas específicas nesta coleção ou visualizar todas as obras que a compõem. Neste período da pandemia, a Biblioteca está aberta à comunidade acadêmica, oferecendo os serviços de empréstimos e devolução mediante agendamento. Parte da coleção está disponível no acervo e pode ser verificada neste link.
Coleção Autorias Negras
Um grupo curador formado por docentes, pesquisadores/pesquisadoras e membros da sociedade civil fará a análise das obras que irão integrar a série da Educ. “Elas serão originadas principalmente, mas não só, na PUC-SP” ressalta Thiago Pacheco.
O diretor da Educ afirma que, num momento inicial, o comitê curador foi orientado a apontar obras de importância, sejam científicas ou de ficção, e que eventualmente não tenham sido publicadas no mercado editorial brasileiro ou que estejam esgotadas, para que a Educ verifique a possibilidade de produção. O grupo também será responsável pelos pareceres com a análise dos originais recebidos pela editora por canal eletrônico específico, para fazer parte da série após a homologação do Conselho Editorial da Educ.
Universidade inclusiva
“A PUC-SP sempre esteve voltada para essa agenda mas temos que avançar cada vez na busca de uma sociedade e Universidade inclusiva, multicultural e igualitária. Como sociedade e Universidade temos um longo caminho a percorrer, com tentativas, acertos e erros, mas vamos conseguir”, comemora a profa. Márcia Flaire, pró-reitora de Planejamento e Avaliação Acadêmicos.
A docente foi a idealizadora do evento que lançará os projetos da Biblioteca Negra da PUC-SP e da Coleção Autorias Negras e organizou a destinação de recursos doados para aquisição do acervo inicial.
A ideia de realizar este evento foi prontamente aceita pela reitora Maria Amalia Andery e recebida com muita alegria e empenho por todas as pessoas envolvidas. “Foi o início de muita reunião e de muita troca de ideias que culminou nesse evento que será um marco na Universidade. Foi tão empolgante essa experiência que, tenho certeza, muito em breve, teremos outros projetos dessa importância e desse porte”, comemora a pró-reitora.
Depoimento de Felipe Corrêa dos Santos - mestrando em Psicologia Social, integrante do Coletivo Neusa Santos e do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade Metamorfose (Nepim)
Primeiramente gostaria de expor minha gratidão, por fazer parte do Coletivo Neusa Santos, do projeto, do movimento-ação envolvido e de poder estar falando por NÓS. O coletivo está feliz, claro que cada um à sua maneira e particularidade, mas os sentimentos são positivos. Reconhecemos a importância histórica, social e acadêmica que a “Biblioteca Negra” expressa. Temos também a consciência de que é uma batalha, que a Biblioteca não representa o fim de algo, mas sim um novo começo, novas possibilidades que vão sendo viabilizadas, que nos convidam, que nos representa e que nos fortalece para nos movimentar com mais afinco em cada ação subversiva. É uma conquista, efeito da superação cotidiana.
Não só para nós integrantes, mas para o que nós representamos, mesmo que em pequeno número, em uma sociedade de maioria negra, estruturada pelo racismo. A importância da Biblioteca Negra está no macro e no micro, nos detalhes e nas estruturas, representa uma superação dos moldes colonizadores. A descolonização da mente, dos espaços institucionais, das ciências e das vidas envolvidas está na gênese do movimento, poder acessar, compartilhar, vislumbrar, referenciar e conduzir os conhecimentos e saberes de sujeitas e sujeitos negras; não apenas de pessoas negras para pessoas negras, mas legitimar que a produção, não é realizada apenas pelo Cenário Dominante, eurocêntrico, estadunidense, masculino e cis. É uma forma de promover reconhecimento sadio, representatividade “transcendente”, convidar as pessoas e concretizar que tais espaços são espaços de pretos sim, e que antes de nós temos muita produção, visto que até carrega o nome de Biblioteca e não de pilhas de livros. Um “novo” olhar de mundo que gera impacto e acolhe.
Ao concretizarmos a Biblioteca, o evento e a coleção da EDUC, em 2021, escancaramos como a colonização alastra e concebe o chamado “epistemicidio” até os dias atuais, como não temos autorias negras dentro das Universidades, como passamos pelas formações sem sequer notar tal disparidade entre quais são as autorias estudadas. No futuro, não queremos distinguir uma Biblioteca Negra, Indígena, LGBTQI+ de uma Biblioteca Branca, mas enquanto faz-se necessário então que assim façamos, é HISTÓRICO, nos “coloca” dentro do “circuito da razão”, permite conhecer e reconhecer as autorias negras, lutar contra a corrente “natural/hegemônica” que todo dia sofre manutenção e se aprimora. Contramovimento! Até que a “cachoeira suba”!