Projeto que visa reinserção social de presidiárias por meio da leitura recebe verba do Pipeq e inicia terceira fase em 2020

Coordenado pela professora Angela Lessa, diretora da Faficla e professora do Lael, o trabalho já ganhou notoriedade internacional

por Redação | 09/03/2020

O projeto Remição de Pena pela Leitura – Uma abordagem transdisciplinar de multiletramentos para a construção da cidadania desejável, que por meio da leitura e escrita trabalha a reinserção de presidiárias na sociedade, se prepara para a abertura da terceira turma de alunas. Iniciado em março de 2019 e contemplado em setembro com verba do Plano de Incentivo à Pesquisa (Pipeq), sob coordenação da professora Angela Brambilla Lessa, diretora da Faculdade de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes (Faficla) e docente do Pós em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (Lael), o trabalho foi desenvolvido a convite da Coordenadoria das Unidades Prisionais da Região Metropolitana de São Paulo do governo do Estado. A proposta era de ensinar leitura às detentas da Penitenciária Feminina da Capital, na zona norte de São Paulo, e estimular a escrita por meio de resenhas; cada texto avaliado seria repassado ao juiz responsável e resultaria na remição de 4 dias da pena. “Eu e três doutorandos do Lael aceitamos este desafio, de forma totalmente voluntária, muito mais do que para ensinar a ler e escrever. Ficamos motivados, porque vimos que poderíamos trabalhar com elas a questão da cidadania, escutá-las, estimular a planejar o futuro, pensar sobre aquilo que fizeram e talvez ressignificar, tudo isso da maneira mais tranquila possível”, afirma a professora Angela Lessa.

Realizadas uma vez por semana, com duração de duas horas, as aulas são para grupos de aproximadamente 30 detentas previamente selecionadas pela coordenação do presidido feminino. Na primeira fase, foram trabalhados os livros A Menina que Roubava Livros, O Diário de Anne Frank e O Caçador de Pipas; já no segundo ciclo, Feliz Ano Velho foi a obra escolhida.

Segundo a professora, para muitas presidiárias, esse foi o primeiro contato com um livro. “Distribuímos os livros e, na semana seguinte, a mais velha do grupo, na época com 62 anos, nos surpreendeu com a seguinte pergunta “como se lê um livro?”. A fala dela foi o início de uma série de atividades que preparamos sobre manuseio do livro, importância da leitura. Por isso que muito mais do que passar um conteúdo linguístico, discutimos valores, princípios, abordamos temas transversais".

A verba de 6 mil reais liberada via Pipeq é destinada para a compra de novos exemplares, cotas de xerox, realização de lanche comunitário, e para que possam contratar quem faça manualmente a transcrição dos dados da pesquisa coletados nas visitas, já que o uso de gravadores e celulares é proibido dentro do presídio.

“Considero uma das melhores experiências da minha vida. O ambiente é diferente, as reeducandas querem, de fato, participar, as discussões vão além da leitura de um livro, e como cidadão e professor de Língua Portuguesa exerço o meu papel ao fomento da inclusão social. Não tenho dúvida do poder da prática de leitura em transformar vidas!”, afirma Bruno Cavalcante , doutorando do Lael.

O projeto já ganhou, inclusive, notoriedade internacional e pela segunda vez será apresentado nos Estados Unidos, explica a professora Angela Lessa. “Graças a este trabalho na prisão feminina, fui novamente convidada pela Caring Foundation para um debate com acadêmicos que tratam de assuntos como deliberação democrática, cidadania, entre outros temas”.

Um dos objetivos desse ano é trazer para o grupo outros estudantes e professores da graduação e da pós-graduação para que as atividades tenham um alcance ainda maior. Também doutoranda do Lael, Grassinete Oliveira considera o contato com as detentas uma oportunidade de se refazer como educadora e de abandonar preconceitos. “Paulo Freire afirmava que a educação não transforma o mundo, mas muda as pessoas para que transformem o mundo. Eu acredito que o projeto é super válido, porque pode transformar o mundo delas de diferentes maneiras, assim como o meu, enquanto pesquisadora-educadora”.

Por ano, cada detenta pode somar, no máximo, 36 dias de remição de pena.

“Ter uma experiência positiva com o livro fará com que elas se sintam mais incluídas e capazes de ler, seja um folheto, um formulário na hora de buscar um emprego, para que comecem a pensar que podem ter um outro papel no mundo e não voltar a cometer crimes”, finaliza a professora Ângela Lessa.

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